Meditar não é pensar; nem refletir; nem julgar; nem esperar por algo. Assim sendo, ao meditarmos, mesmo  quando pensamos que estamos fazendo algo bom, ou refletimos sobre a importância de meditar, ou  julgamos que o nosso ato é sagrado, ou esperamos por um fenômeno superior, estamos de fato sabotando  a técnica meditativa. É por isso que Ramana Maharishi dizia que “não se pode pedir ajuda ao ladrão para  pegar o próprio ladrão”. Este texto tentará explicar essa premissa. 

Sem dúvida, a maior confusão que se faz, quando se fala em meditação, é confundir a técnica com o efeito.  As pessoas meditam, experienciam efeitos agradáveis, e dizem que a meditação é aquele efeito. Dizem, por  exemplo, que “meditar é estar no vazio”, ou que “meditação é sentir-se em harmonia com o Todo”, ou  ainda que “meditação é preencher o coração com o Universo”. Porém, esquecem de dizer que: 1) Tal efeito  foi conseguido através de uma técnica e descrevê-lo não ensina como atingi-lo; 2) O efeito sobre você pode  ser bem diferente daquele que aconteceu com a outra pessoa, e; 3) Mesmo que o efeito com você seja o  mesmo, a descrição feita por aquela pessoa não corresponderá (para você) à definição que você teria para o  mesmo estado. Assim sendo, estou sempre vendo indivíduos lendo descrições de efeitos da meditação, e  tentando meditar procurando imaginá-los, procurando reproduzir o efeito do qual ouviu falar, e isso é um  intenso exercício mental de lógica. Um contra-senso. 

A grande dificuldade é que o próprio ato meditativo é um contra-senso em si mesmo. Como poderíamos  aprender – através da mente – uma técnica que iria silenciar a mente? Seria como “Pedir ao barulho para  ajudar a silenciar ao barulho” ou, como disse Ramana Maharishi, pedir ao ladrão para ajudar a pegar o  próprio ladrão (no livro “Ensinamentos Espirituais”, Editora Pensamento). Você consegue imaginar uma  cena como essa? Você chega e diz: “Seu Ladrão, por favor, você poderia me ajudar a pegar o Ladrão”.  Todavia, o sujeito com quem você está falando já é o próprio ladrão. Ele, então, espertamente lhe responde:  “É claro que posso. Vamos lá!”. Aí, então, vocês dois começam a correr juntos para tentar alcançar o ladrão.  Parece estranho? Pois saiba que isso é o que muitos fazem ao tentar meditar. Usam a mente para conceituar  um estado, para definir uma sensação, e ficam “sentindo esse estado”, ficam “curtindo esse barato” que  eles mesmos (suas mentes) programaram. E ainda dizem que estão em uma atividade que está além da  mente! Mas como, se a própria mente, antes de começar a prática, já delimitou como seria – ou deveria ser – esse estado? Dá para perceber o enorme equívoco?Veja, então, que não é possível pedir ajuda ao ladrão  para pegar o próprio ladrão, ou seja, não é possível pedir ajuda à mente para silenciar a própria mente, sob  pena de estar caindo em uma armadilha feita por você mesmo. 

Mas, então, como é possível meditar? Afinal, mesmo que não tentemos imaginar uma sensação, até mesmo  para entender uma técnica precisaremos usar a mente. Para lembrar-se da âncora, ou para perceber as  sequências de pensamentos que vão surgindo, ou para voltar novamente à âncora, você precisará usar a  mente. Então, como é possível? Esta “sinuca de bico” foi o grande desafio dos primeiros meditadores.  Vejam bem: Eles precisavam usar uma técnica, inicialmente criada pela mente, para silenciar a própria  mente, mas não poderiam deixar que, durante a aplicação da técnica, a mente lógica predominasse. Mas  que “sinuca”, hein?!Foi então que alguém teve a idéia de criar o truque da “missão impossível”. A forma  encontrada foi a de propor uma tarefa (manutenção da âncora) que, para atingir um objetivo (obter  relaxamento da lógica), exigia um esforço hercúleo, sobre-humano, da mente do meditador. Não é possível,  por exemplo, colocar um elefante sobre a cabeça de um alfinete, nem compactar todas as suas roupas em  uma caixa de fósforos, tampouco apertar a mão simultaneamente de um milhão de pessoas. Da mesma 

forma, não é possível colocar toda a nossa atividade lógica, toda a atividade da nossa mente, em uma única  tarefa (manter a âncora). 

Nossa mente é uma super-usina de criação de pensamentos, e tentamos dirigir toda essa enorme correnteza  de pensamentos a um único alvo proporcionalmente minúsculo: a âncora. Na meditação, as correntes de  pensamentos são “abandonadas”, e voltamos repetidamente para a âncora. O “super-poderoso” cérebro  humano tenta comprimir sua atividade em um único ponto, e essa é certamente uma missão impossível. A  partir daí, acontece algo “mágico”, um autêntico salto quântico. A mente se altera, a consciência se altera e  começamos a entrar no estado meditativo. 

Como mostram os mapeamentos cerebrais de meditadores, a primeira alteração perceptível na meditação é  a ativação do lobo pré-frontal. Esta região do cérebro é responsável, entre outras coisas, pelo planejamento  lógico e execução de tarefas. Ao que nos parece, a ativação pré-frontal é resultado do exercício de âncora  (que nada mais é do que a execução de uma tarefa). Porém, depois de certo tempo, outras modificações  ocorrem, e a atividade no lobo pré-frontal fica diferente do que estava no começo da técnica. O nosso  esforço em manter a âncora ativa o lobo pré-frontal, mas depois acaba por alterar sua função. Quem  descreveu isso muito bem foi Arne Dietrich, no que ele chama de “hipofunção pré-frontal”. 

Em outras palavras, poderíamos dizer que o lobo pré-frontal, ao ser desafiado por essa “missão  impossível” que é meditar, esforça-se tanto que acaba sendo “desregulado”, perde função e permite o  relaxamento da lógica. Segundo Dietrich, os estados alterados de consciência teriam em comum  exatamente essa “hipofunção pré-frontal”. Você pode ler esse interessantíssimo artigo no link:  http://www.empty-memories.nl/science/Consciousness_Cognition.pdf 

Vejam, então, que truque sensacional, encontraram os primeiros meditadores. Eles produziram técnicas,  que poderiam ser explanadas com a mente, compreendidas com a mente, mas que, ao serem aplicadas,  seriam capazes de produzir um estado “além-mente”, e assim modificar a atividade mental. Perceberam  que o ladrão não poderia pegar o ladrão, mas que seria possível pedir ajuda ao ladrão, fazer de conta que  se estaria sendo enganado pelo larápio, e colocá-lo para correr atrás dele mesmo até que ele se exaurisse, e  então pudesse ser pego de verdade. É por isso que sempre repetimos: não “produza” um estado de  meditação, mesmo que ele seja “lindo”, ou “maravilhoso”, nem mesmo “sagrado”. Isso será fruto da sua  mente! Apenas medite; somente aplique a técnica com total disposição e ela mesma (a técnica) se  encarregará de ludibriar a mente. 

A técnica da meditação é um exercício, e o estado meditativo é um truque que brota desse exercício. Ele não  pode ser mentalmente produzido, nem planejado, e muito menos interpretado. É um salto quântico, que  legamos dos “mágicos” meditadores de outrora. 

by Roberto Cardoso

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